Uma carta de amor à Resident Evil Outbreak

Resident Evil Outbreak é provavelmente um dos títulos menos jogados da série Resident Evil. Um jogo muito à frente de seu tempo, não é de se admirar que poucos tenham experimentado o game em toda a sua glória: online, com parceiros controlados por outros jogadores e com um HD.

Quem bem lembra, na era PlayStation 2, jogar online era algo ainda incomum e bem experimental. Requeria um adaptador de internet para o console, que era comprado à parte. Sendo assim, a grande maioria das pessoas que se aventurou pelas ruas de Raccoon City em Outbreak, certamente experienciou o game em seu âmbito offline.

Não me levem a mal, o jogo era muito bem polido, trazia muitos desafios interessantes, uma boa jogabilidade nos moldes clássicos (e a opção de controle livre, como os remakes em HD atuais), e até tinha um certo charme em tomar conta da I.A. de seus parceiros (às vezes até deixá-las morrer para você se tornar o único grande sobrevivente), que era longe de ser inteligente. Mas, a verdade é que o jogo realmente brilhava quando você o conectava na rede e partilhava da sobrevivência com outros jogadores (ou não, tendo em vista que fogo amigo era uma opção válida ao se escolher uma sala).

Conectado à internet, as coisas ainda não eram tão simples, por mais que você conhecesse os cenários e seu segredos. O jogo se propõe a tudo ser feito no menor tempo possível, para maior número de pontos, e isso é ainda mais complicado quando se tem um contador constante na forma de um “medidor de contágio” te lembrando a se apressar toda vez que soma 10%. Caso você demorasse demais, seu medidor de contágio chegava a 100% e seu personagem se tornava um zumbi. Literalmente. Você voltava como um zumbi por um certo tempo e poderia continuar jogando tentando matar seus aliados remanescentes (ou até eles te matarem).

Apesar do contador, as fases em si podiam ser resolvidas com certa calma e exploração, quanto mais rápido melhor, mas definitivamente havia margem para jogos mais lentos com foco em observar os cenários e apreciar a trama de cada um deles, por que, sim, cada um deles possuía uma história individual, o que rende até hoje debates entre os fãs de como cada cenário se encaixaria numa linha do tempo e quais personagens vivenciaram cada um deles num aspecto mais “cânon”, apesar de não haver um propriamente dito.

Outra coisa que é bem comum hoje em dia, mas que era extremamente necessário para Resident Evil Outbreak em sua época, era a aquisição de um HD. Ao ser instalado no HD o tempo de loading do jogo chegava a ser de apenas 1-2 segundos entre uma sala e outra, comparado com os 16-18 segundos que levavam sem ele. Era definitivamente um teste de paciência, mas eu me orgulho em dizer que fiz mais de 120 horas no jogo sem o HD, tamanho era meu amor por ele, acabava se tornando um mero detalhe (mas que é de fácil entendimento o por que a maioria torceria o nariz e se distanciaria do título).Para se ter uma ideia do peso que o HD tinha para uma melhor experiência, quando o PlayStation 3 finalmente saiu, ele ainda possuía compatibilidade com jogos de PlayStation 2, incluindo Outbreak 1 e 2. Como o PS3 possuía, de fábrica, um adaptador de internet e um HD interno, muitos jogadores quebraram a maioria dos recordes de tempo das fases dos jogadores de PlayStation 2, com algumas sendo concluídas em meros 5 minutos!

Apesar da popularidade, a Capcom anunciou o encerramento dos servidores pouco tempo depois do lançamento do PlayStation 3, e nunca mais mencionou o título ou qualquer tipo de sequência para ele. Possivelmente dado ao fiasco de vendas de Resident Evil Outbreak 2 (em parte, culpa da própria Capcom, explico melhor o motivo mais a baixo).

O jogo certo na hora errada

Hoje, como dito acima, é incrivelmente fácil se conectar a internet. Todos os consoles vêm de fábrica com um adaptador e um HD, essenciais para Resident Evil Outbreak ser plenamente apreciado. Também temos uma crescente demanda por jogos online, tendo em vista que são eles que, muitas vezes, cobrem os gastos das grandes empresas com as experiências offline: por possuírem uma longevidade maior, eles costumam também ser recheados das infames microtransações e DLCs, seja pelo bem ou pelo mal.

Dito isso, é de se admirar como Outbreak permanece uma sub-franquia morta, preenchendo todos os requisitos necessários para um lançamento de sucesso, de grande a modesto (jamais um fracasso).

O game se baseava num esquema de pontos, no qual você poderia comprar novos personagens, skins, artes conceituais, entre outras coisas. Isso poderia ser facilmente mantido, com acréscimo de outros itens por DLCs, como, por exemplo, um pacote de skins dos S.T.A.R.S., ou mesmo um pacote premium com os próprios S.T.A.R.S., dublados por dubladores diferentes e com habilidades temáticas.

Em vez de simplesmente lançar um novo jogo com a mesma jogabilidade, poucas melhorias e diferenças, disfarçado de um segundo título totalmente novo e declarar fracasso de uma franquia após essa péssima decisão interna (oi, Resident Evil Outbreak File#2, estou falando de você mesmo), a Capcom poderia lançar atualizações e expansões online, custeadas ou não, ao jogo base de forma infinita. Skins de armas, personagens, itens especiais, novas fases, tudo garantiria uma longevidade sem igual para Outbreak hoje em dia. É literalmente uma mina de ouro esperando ser explorada.Outra coisa que funcionaria muito a favor de Resident Evil Outbreak também, nos dias de hoje, seria o fato de que ele é composto de pequenas fases. As pessoas não costumam jogar com o mesmo afinco como antes, era muito fácil entrar numa missão e sair logo após terminá-la. E não vamos esquecer da receptividade do público aos remakes de Resident Evil e Resident Evil Zero, mostrando uma clara carência de títulos com a jogabilidade clássica no mercado atual (e o público mostrou que ainda existe e está disposto a pagar por mais experiências como essas).

Muito à frente de seu tempo

Pelos elementos já citados, não é de se admirar que Resident Evil Outbreak estivesse muito a frente de seu tempo (e que tenha sofrido por conta disso). Antes mesmo de Left 4 Dead, Resident Evil já trazia seus personagens comuns em um cenário caótico tentando sobreviver em conjunto; antes mesmo de Friday the 13th, The Game, Resident Evil Outbreak já trazia um jogador como um zumbi tentando caçar os demais sobreviventes; antes mesmo de Resident Evil 5, você já podia jogar Resident Evil em co-op com um amigo, na verdade, 3 outros amigos.Todos esses títulos foram jogos feitos após Resident Evil Outbreak, se baseando em elemento que já se apresentam nele de uma forma ou de outra. Todos eles foram grandes sucessos, qual a desculpa para não ressuscitar Resident Evil Outbreak mesmo, Capcom?

O horror

Com um elenco composto por uma garçonete, uma jornalista, uma estudante universitária, um médico, um segurança, um funcionário público do metrô e um policial de baixo escalão da R.P.D., o foco de Resident Evil Outbreak sempre foi de ser um Resident Evil clássico, com pessoas inexperientes, só que num âmbito online.

Os cenários contemporâneos ilustram o horror de Raccoon City durante a infecção de forma primorosa, com um dos melhores gráficos do PlayStation 2. Cada um dos personagens teriam que sobreviver a esses cenários com suas próprias habilidades, pontos fortes e fracos, e eles eram muitos! Enquanto Cindy, a garçonete, poderia ser um mais lenta e fraca que Kevin, o policial de baixo escalão da R.P.D., ela compensava possuindo uma esquiva mais eficiente e um inventário que comportava quase que o triplo de itens curativos.

Por promover esse aspecto de pontos fortes e fracos, era praticamente impossível sobreviver sem a colaboração de seus aliados, especialmente nos níveis mais elevados. E mais do que em sustos (como a maioria dos jogos de terror atualmente no mercado), é aí que o horror de Resident Evil Outbreak realmente brilhava: na pura e simples sobrevivência. Com inimigos ágeis e variados e de ressurgimento basicamente infinito, o jogo sempre estava agindo contra você. Um verdadeiro “survival horror”.

Os pedidos de retorno

Desde o fechamento dos servidores, fãs do mundo inteiro pedem para a Capcom ressuscitar Resident Evil Outbreak, seja num remaster, num remake ou mesmo em uma sequência. Mas esses pedidos sempre foram ativamente ignorados, e ainda o são até hoje. Não se sabe os motivos da resistência da Capcom em relançar esses títulos: as respostas são sempre efusivas e muitas vezes, literalmente ignorantes. Em um dado momento foi dito pela empresa que ressuscitar os servidores seria impossível, e nem 3 meses depois, os fãs conseguiram ressuscitar os servidores (de maneira amadora, mas estável e funcional) para os jogadores de PlayStation 2 (é menos estável em emuladores, provavelmente pelo aspecto pirata).Apesar de nenhuma resposta oficial, a campanha para o retorno do jogo nunca diminuiu, sendo um (se não o maior) tópico de discussão dos fóruns oficiais da Capcom, na Capcom-Unity. Todos esperando pelo retorno dos 8 civis e heróis de Raccoon City que sofreram tanto ou mais que os consagrados Leon, Jill e Claire, e pela possibilidade de jogar essa joia mais uma vez com seus amigos: tanto os que já jogaram no passado, quanto a novos fãs.

Pessoalmente falando

Eu sempre amei Resident Evil Outbreak, foi de longe o título que eu mais joguei da franquia, tanto online como offline. Eu possuía 100% de realizações em quase todos os cenários, itens secretos, skins, nas estatísticas de game eu me divertia vendo o quanto eu morri nesse ou naquele cenário, com quais personagens eu joguei menos ou mais vezes, com quem eu morri ou sobrevivi mais… Tudo isso somava a mais ou menos 120 horas e mais 72 no segundo game da franquia.

Apesar de não possuir uma história linear, eu também me pegava gostando dos personagens tanto quanto gostava de alguns dos personagens mais famosos de Resident Evil. Cada um possuía uma personalidade, um jeito de andar, atacar, atirar, correr, de reagir a algum item ou situação, eles também possuíam itens pessoais que poderiam ser coletados e colecionados que diziam muito sobre suas personalidades.Cindy possuía uma coleção de bonecos do mascote guaxinim da cidade Raccoon, ela adorava botânica e as propriedades curativas das plantas, se tornando uma autodidata em primeiros socorros e até mesmo em tocar piano; Jim era um fã de basquete e possuía uma paixão por tênis, torrando quase todo o seu salário só com isso, apesar de medroso, ele possui um coração de ouro e é extremamente observador, graças aos quebra cabeças e jogos de sete erros que vive resolvendo para matar o tempo em seu trabalho.

Isso sem mencionar os outros personagens, que também possuem seus próprios trejeitos e histórias pessoais. Vai dizer que já não é mais do que se pode falar que conhecemos sobre alguns dos personagens centrais e seus interesses mesmo eles tendo estampado muitos mais títulos?

É uma pena ver Resident Evil Outbreak relegado a obscuridade a uma morte lenta, sem qualquer apreço pelo que ele fez e ainda pode fazer pela série. Mas é como dizem, a esperança é a última que morre. Ainda mais depois de ver o nome de Alyssa Ashcroft estampado os jornais de Resident Evil 7. Torçamos, amigos!

Arte/destaque: hakusekirei