No passado longínquo, lendas de diversos tipos – desde seres humanos tomando formas monstruosas para caçar animais durante noites de lua cheia até a existência de espécies sobrenaturais que dominavam nossas mentes durante o sono – eram utilizadas como forma não só de disciplina, mas também para trazer um pouco de luz a fenômenos inexplicáveis.
Em tempos modernos, nos quais a ciência consegue desvendar tais lendas, provando que esses fenômenos não passavam de coisas como lobos hipertrofiados ou nosso inconsciente jogando truques conosco, o apelo dessas histórias, teoricamente, deveria ter diminuído. Entretanto, ao dar uma olhada nos elementos que compõe a cultura pop, vemos que não é bem assim.
Vampiros, lobisomens e zumbis são parte central de muitas tramas de sucesso desde que começaram a ganhar as páginas de livros e de quadrinhos que contavam suas histórias. Essas tramas, como Drácula, de Bram Stoker, e The Walking Dead, de Robert Kirkman, ganharam adaptações em vários formatos midiáticos com grande êxito comercial e de crítica.
Dentre as lendas de terror, entretanto, os zumbis se diferenciavam justamente por não ter uma “grande figura”, caso oposto ao dos vampiros. Seu perigo era representado muito mais pela força da horda de seres humanos transformados em mortos-vivos cujo único anseio é se alimentar de seus pares ainda com vida, sem o menor apreço por ninguém nessa busca de apetecer sua fome insaciável.
Quem mudou essa ideia foi Resident Evil 3, com o superzumbi Nemesis perseguindo a heroína Jill Valentine durante o jogo inteiro. Por meio do remake de RE3 tivemos esse reencontro com o supervilão que marcou de forma definitiva a história dos videogames e também da mídia de zumbis em geral.
Um grande vilão zumbi chega aos videogames
Obviamente, Nemesis não foi o primeiro grande vilão ou “chefe” da franquia Resident Evil. Antes dele, já havíamos encontrado Tyrants, tanto no primeiro quanto no segundo Resident Evil, em embates que marcaram época graças ao uso de bazucas nas batalhas contra estes zumbis ultrapoderosos. Mas Nemesis se diferencia justamente por ser parte constante de toda a trama de Resident Evil 3. Não é por menos que o nome do vilão é também o subtítulo do jogo, o que indica de cara a sua importância.
Antes de Nemesis, os grandes antagonistas do jogo eram as hordas de zumbis e de animais que uma vez expostos ao t-vírus, criado pela Umbrella Corporation, se transformavam em monstros sanguinários. Muito como ocorre nos contos retratados no cinema por George Romero, em filmes como A Noite dos Mortos-Vivos, o objetivo desses seres era se alimentar da única alma viva adentrando Raccoon City – coincidentemente, o herói da trama, comandado pelo jogador.
Nemesis mudou o jogo por ser um zumbi não só altamente poderoso e resistente, mas também por ser muito mais inteligente do que seus pares. Ele possuía personalidade própria e também a habilidade de usar seus sentidos naturais, que procuravam carne humana para perseguir os membros da S.T.A.R.S. que ainda estavam vivos em Raccoon City após o desastre que zumbificou toda a cidade. Não é à toa que Nemesis também era chamado de “Pursuer” – “perseguidor”, na tradução para o português.
Nemesis não foi o primeiro…
Nos videogames, Nemesis reina quase supremo como um dos vilões zumbis mais famosos e celebrados da mídia. Evidentemente, ele não é o único a ocupar este espaço dentro da cultura pop.
Na série Game of Thrones, o Rei da Noite é um morto-vivo que comanda a horda dos Caminhantes Brancos, que se recusam a cair em batalhas a não ser que seu líder seja derrubado. Já nos filmes Sexta-Feira 13, Jason Voorhees é o vilão e o protagonista que ganha vida após sua morte num acampamento por conta da sua sede de vingança. Entretanto, também existe espaço para o protagonismo “zumbificado” em outros ramos da indústria do entretenimento, como ilustram o caça-níquel Lost Vegas, que reúne Las Vegas e as criaturas e está disponível na plataforma da Betway caça-níqueis online, e os jogos da Bethesda, como Fallout e Skyrim, que apresentam os ghouls e os draugr, respectivamente. Voltando ao setor do cinema, é possível até mesmo encontrar “zumbis românticos”, como mostra a produção Meu Namorado É um Zumbi. Cada uma dessas representações de zumbis têm características próprias que as destacam das outras.
…e nem será o último
Os remakes de Resident Evil pela Capcom vieram em muito boa hora considerando o estado da série antes da volta destes clássicos aos consoles e ao PC. Desde a guinada à ação dada a partir de Resident Evil 5, além da exploração em ambientes mais abertos e por isso também mais claros em Resident Evil 4, parte da “essência” dos jogos originais parecia estar sendo perdida. Com isso, era talvez a hora de dar um “reset” na trama, mostrando aos novos fãs de RE o que fez a série ter tamanho sucesso desde seu primeiro jogo.
Os remakes são também uma forma de reconquistar velhos fãs da franquia que não viam mais apelo em Resident Evil, fosse nos jogos mais recentes ou nos filmes de ação inspirados na trama. A nostalgia fala bem alto ao vermos a tela inicial dos remakes dos dois primeiros Resident Evil, e a história em si é algo que ainda nos fisga de maneira diferenciada até mesmo em comparação a jogos mais modernos que também envolvem zumbis.
Esses fatores deram a sustentação necessária para que Resident Evil 7 fosse desenvolvido e lançado. Ainda que Raccoon City e o esquadrão da S.T.A.R.S. tenham sido “abandonados”, ele ainda representava um muito bem-vindo retorno à exploração e ao horror, que fazem de RE algo icônico.
Uma vez que a recepção de crítica e de público tem ultrapassado expectativas, esperamos também que este sucesso seja o bastante para sinalizar à Capcom que os fãs querem mais jogos de horror. Por ora, a empresa japonesa parece indicar que continuará a atender nossos anseios.