Resident Evil 5 tem problemas e não agrada a todos, mas causa impacto pelas mudanças

Menos amado que o Resident Evil 4 (2005) e, certamente, muito mais bem aceito que o Resident Evil 6 (2012), o Resident Evil 5 (2009) pode parecer só um jogo que está no meio da mudança e do caos, mas, na verdade, ele é uma decisão interessante para a série e possui méritos que devem ser lembrados. Neste texto vamos discutir a sua importância e refletir sobre as mudanças que marcaram a franquia a partir dele.

RE5 é um jogo complicado. E não falo somente sobre as escolhas criativas da Capcom quanto ao quinto título numerado da série ou da decisão de alterar o foco da franquia a partir do quarto jogo. O jogo é complicado em sua recepção e em como é visto, mesmo após anos, desde seu lançamento em 2009.

É comum ver comentários de fãs e jogadores no geral que não gostaram do jogo. Eles dizem que “não passa de um jogo de ação e que nada tem relação com o que a série construiu até ali”. No ponto de vista deles, mesmo em relação ao seu episódio anterior, que embora tenha muitos elementos de ação, a aventura de Leon S. Kennedy no interior remoto da Espanha, oferece situações opressoras que lembram os momentos mais assustadores da série, algo que para muitos, Resident Evil 5 não faz.

Sim, é verdade que a jornada de Chris Redfield e Sheva Alomar tem momentos bem mais explosivos. Mas sendo sincero, lhes faço uma pergunta: O que define um horror de sobrevivência? A atmosfera? O gerenciamento de recursos em meio a uma situação adversa? É uma pergunta que sempre me faço e, por mais que eu pense, não consigo ver onde RE5 não se encaixa como um jogo de survival horror, mesmo sendo um título carente de uma atmosfera de terror, o gerenciamento de recursos é colocado em uma perspectiva nova aqui quando adiciona o multiplayer.

E uma das grandes novidades na época foi a inserção desse multiplayer online e offline cooperativo, na qual, permitia que jogássemos toda a história com outra pessoa. A dinâmica do jogo mudava completamente, pois o player 1 deveria dividir seus recursos o tempo todo e, para isso, deveria haver comunicação com seu parceiro, o player 2, para que nada faltasse, seja itens, armas e munição. Hoje, vejo isso como uma abordagem diferente para pensar o horror de sobrevivência, pois, mesmo com diversos elementos que não fazem parte de seu entendimento como um Resident Evil, o quinto jogo ainda trabalha com a base estabelecida em 1996 por Shinji Mikami para construir a identidade da série, mesmo que isso signifique mudar a sua estrutura.

Por mais que exista bastante resistência, Resident Evil 5 é um dos jogos mais vendidos pela Capcom e um dos mais jogados online na Xbox Live e na Playstation Network, batendo de frente com gigantes multiplayers como Call Of Duty, e sendo o único game não competitivo a figurar nessa lista. Embora não tenha sido o primeiro jogo do seu gênero com mecânicas de coop, foi o que implementou melhor, sendo de suma importância para época, mostrando que jogos de survival horror podem funcionar em “duplas”.

Sempre fui defensor de que “conservadorismo demais faz mal para qualquer série de videogame”. Claro, mudanças devem ser feitas de forma coesa e com um bom planejamento, sempre utilizando a base da série para que, ainda que mude, mantenha sua essência. Temos diversas franquias como exemplo de mudanças que permitiram aos seus jogadores novas perspectivas e evoluíram a experiência como um todo. São eles: God Of War, The Legend Of Zelda, Final Fantasy e Metal Gear Solid. Portanto, Resident Evil é uma dessas grandes séries a dar esse pontapé e continuar a mentalidade de “renovação”. O sucesso comercial do jogo, certamente, foi um ponto encorajador para a Capcom e para a indústria, tanto que no futuro viria reformular outras franquias como Devil May Cry. Mas a renovação também tinha prazo de validade, pois após o ‘’fracasso’’ de RE6, a Capcom precisaria se reinventar de novo. Entre erros e acertos, Resident Evil é um exemplo tanto positivo quanto negativo dentro do próprio estúdio.

Vou abordar outro ponto, a narrativa. Sendo muito sinceros com vocês, eu nunca fui muito fã das histórias da franquia. Nunca foram o ponto que me chamava mais a atenção, mesmo aqueles que são os meus favoritos da série. Gosto muito mais do universo criado em torno desses personagens e deles próprios do que da narrativa contada em cada um desses títulos. Talvez, Resident Evil CODE: Veronica seja o RE que eu mais gostei neste quesito antes de RE5. Mas, ainda sim, tenho meus problemas de como a história é contada.

Aqui somos apresentados a um Chris Redfield traumatizado com a morte de sua parceira Jill Valentine, algo que o assombra a todo instante, o enchendo de culpa e deixando-o visivelmente desconfortável em ter uma parceira, no caso a Sheva, como a sua nova companheira de missão. Chris teme o que possa acontecer com ela. Todos esses traumas e medos são despejados na figura do vilão Albert Wesker, responsável pela morte de Jill e a manifestação física dos medos do agente da BSAA. Tudo isso é muito bem construído durante o jogo com Chris, tendo que lidar consigo mesmo para que possa dar um fim a essa guerra pessoal e, também, no precursor de seu pesadelo que começou anos antes, na Mansão Spencer. Além de ser uma forma inteligente de humanizar o personagem e dar significado a sua luta, faz dessa uma forma satisfatória e bem executada para dar fim ao icônico vilão que também tem seus traços gananciosos e psicóticos levados ao extremo aqui.

Jill Valentine em Resident Evil 5 – Desperate Escape

Foi um passo enorme, no que diz respeito à narrativa, a abordagem feita ao Chris e Albert. Isto teve um um impacto direto na construção de alguns spin-offs como os dois Revelations, o sétimo jogo e, no mais recente, Resident Evil Village. Algo que possivelmente vai respingar até no remake de Resident Evil 4, com a possibilidade de vermos um Leon atormentado, menos “super-herói”, precisando lidar com o passado. Algo que faz muito mais sentido, pelo menos para mim.

Resident Evil 5 tem problemas e entendo que não agrade a todos. Eu mesmo desgosto da maioria das lutas contra chefes aqui e de muitos momentos que soam completamente desnecessários. Mas também é um jogo que corre riscos e muda o suficiente para ter impacto na série e na própria indústria dos videogames como um todo.

Este conteúdo contou com revisão de João Alves